Contribuição Previdenciária e o afastamento do empregado pela Covid-19

Natália Pimentel • 2 de março de 2021

Atualmente o mundo enfrenta uma grande crise em virtude do coronavírus (Covid-19), que foi classificado como pandemia pela Organização Mundial de Saúde – OMS, no dia 11 de março de 2020.


Com o objetivo de conter o avanço da doença, foi determinada a paralisação da atividade de diversas empresas e o isolamento dos indivíduos em suas casas. Naturalmente, tal paralisação - de importância fundamental para a contenção do vírus pandêmico - reverbera diretamente na atividade econômica das empresas, na medida em que altera a rotina dos agentes econômicos e da sociedade como um todo, impactando na oferta e demanda de bens e serviços e alterando todas as perspectivas de curto, médio e longo prazo.


Neste contexto, é certo dizer que as formas de trabalho foram substancialmente alteradas, isto porque as empresas precisaram se adaptar às exigências elencadas pelo Ministério da Saúde no que se refere ao distanciamento social. Diante deste novo cenário, algumas empresas conseguiram se adaptar e realizar suas atividades por meio do home office, no entanto, esta possibilidade não se estendeu a todos os setores.


A depender da atividade empresarial realizada, o regime de teletrabalho (trabalho remoto) não é adequado para determinadas empresas que, devido às funções desempenhadas pelos seus empregados, não têm como implementar o home office.


Diante deste contexto, importante destacar que foi editada a Medida Provisória n° 936, que criou um programa emergencial para garantir empregos, autorizando para tanto (i) a redução temporária e proporcional de jornada de trabalho e salário, nos percentuais de 25%, 50% ou 75%, por até 90 dias; ou (ii) a suspensão temporária do contrato de trabalho por até 60 dias. No período da redução ou suspensão, o empregado receberá um benefício que será pago pela União. Destaque-se, no entanto, que a MP trouxe em seu bojo algumas ressalvas, dentre as quais:


(i) A adoção das medidas estabelecidas na Medida Provisória – seja redução de jornada ou suspensão do contrato de trabalho – terão como consequência a impossibilidade de demissão do empregado nos períodos abaixo descritos (caso ocorra a demissão, o empregador deverá pagar uma indenização ao trabalhador):



  • durante o período acordado de redução da jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária do contrato de trabalho; e



  • após o restabelecimento da jornada de trabalho e de salário ou do encerramento da suspensão temporária do contrato de trabalho, por período equivalente ao acordado para a redução ou a suspensão.

 

(ii) Para os empregados sem diploma de nível superior que recebam salário superior a R$ 3.135,00, e para os empregados com diploma de nível superior que tenham salário superior a R$ 12.202,12, estas medidas somente poderão ser adotadas mediante convenção ou acordo coletivo (o que torna o processo bem mais burocrático).


Em que pese a existência da referida Medida Provisória, é certo que muitos empregadores que não puderam atribuir aos seus empregados o desempenho do trabalho remoto, optaram por distanciar seus trabalhadores sem se valer do programa emergencial em comento, isto em virtude das ressalvas ali elencadas, como, por exemplo, a estabilidade do funcionário por período equivalente ao da redução/suspensão.


Para tanto, ao afastar os empregados de suas atividades, mantiveram o pagamento dos valores que antes eram pagos a título de salário. Ora, diante do cenário econômico vivenciado é natural que as empresas busquem adotar as medidas que menos comprometam sua operacionalização, evitando utilizar de vias que ocasionem uma maior onerosidade, seja com elevação no custo com indenizações por demissões, seja pela perda de investimentos em mão de obra qualificada.


Com efeito, a adoção da postura elencada acima acarreta efeitos jurídicos que merecem destaque, sobretudo desdobramentos tributários.


As empresas, no exercício de suas atividades, estão sujeitas ao pagamento das chamadas Contribuições Previdenciárias Patronais, referidas no artigo 195, I, alínea “a” da Constituição Federal, cuja incidência se dá sobre “a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício”.


Ocorre que, a Constituição Federal ao utilizar a expressão “rendimentos do trabalho” afastou a possibilidade de incidência da Contribuição Previdenciária sobre as chamadas verbas indenizatórias.


Sobre o tema, o STJ já decidiu, sob o rito dos Recursos Repetitivos (REsp 1230957/RS), que não incide contribuição previdenciária patronal sobre as verbas que possuem natureza indenizatória, tendo tratado expressamente do valor referente ao aviso prévio indenizado. Do mesmo modo caminhou a Procuradoria Geral da República em seu parecer juntado aos autos do RE 1.072.485/PR, quando declarou que “não incide contribuição previdenciária sobre o terço constitucional de férias, sejam estas indenizadas ou gozadas, pois a verba possui natureza indenizatória/compensatória e não constitui ganho habitual do empregado”.


Ora, da análise do próprio texto constitucional (art. 195, I, “a”) verifica-se que o tributo incide sobre a folha de salários e os demais rendimentos provenientes do trabalho – ou seja, com natureza de contraprestação pelo serviço prestado pelo trabalhador.


No caso em análise, em que pese exista a possibilidade de o Fisco adotar entendimento divergente, o valor pago pelo empregador ao funcionário que está em casa sem realizar qualquer tarefa, nem mesmo obedecendo às ordens do empregador, não passa de verba com caráter indenizatório.


O texto constitucional não dá espaço para interpretação diversa – a contribuição previdenciária patronal incide sobre (i) a folha de salários; e (ii) demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício.


A análise do caso nos conduz à – quase óbvia – conclusão de que, uma vez que o trabalhador não está prestando seu serviço, o valor recebido não tem natureza retributiva da sua força laboral, e sim indenizatória, com o objetivo de auxiliar o empregado a enfrentar o momento de crise ora vivenciado.


Por fim, importante destacar que a situação analisada não diz respeito aos casos em que o empregado está à disposição do empregador (circunstância que caracteriza o sobreaviso). Note-se que, no presente caso, o funcionário não está em sua casa aguardando o chamado, pelo empregador, para o serviço. O que ocorre, em verdade, é uma situação de força maior – sem previsão de volta à normalidade – que obrigou as empresas a adotarem medidas que respeitassem o distanciamento social imposto.


Pelo exposto, parece-me no mínimo irrazoável a incidência de Contribuição Previdenciária Patronal sobre verba que evidentemente não tem natureza retributiva pela força laboral, por direta afronta ao quanto disposto no texto constitucional.



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